segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Falta de Respeito

Um coisa engraçada era o jeito que ele tratava as pessoas quando era menor. Não muito menor, tipo adolescente mesmo, antes de ele começar a fazer análise. O garoto simplesmente não tinha noção das coisas, era assustador. Loucaço.

Lembro que uma vez ele fez uma parada inesquecível. Na hora, eu fiquei meio que em estado de choque, embora com um sorriso discreto no rosto. Já hoje em dia, eu simplesmente lembro dessa história e rio pra caralho. Além do mais, acho que o meu irmão já é normal.

Enfim, de qualquer jeito, a história é a seguinte:



A família toda tava reunida num desses eventos aleatórios. Não lembro bem se era páscoa, natal ou simplesmente o aniversário de alguém. Não importa, o fato é que estavam vários membros sortidos da nossa família, todos unidos e arrumadinhos, discutindo qualquer coisa e rindo do que os meus primos aprontavam quando eram pirralhos. Aqueles típicos casos inesquecíveis, que são sempre relembrados nesses eventos familiares. Foi então que o meu irmão, em uma pequena brecha de silêncio, entrou também pra história ao perguntar pra minha tia:

- Quando você chupa o tio Victor, você engole o esperma ou ele goza na sua cara?

Os sorrisos e suspiros nostálgicos foram imediatamente interrompidos. Gaguejando, a tia Laura perguntou:

- O... o que você disse?

- Quando você chupa o tio Victor, o pau dele. Tipo, sexo oral - meu irmão explica. - Ele goza na sua cara ou na sua boca, pra você engolir?

Meu irmão não ria, mas também não parecia estar sério. Ele simplesmente encarava a situação com a mais completa indiferença. O filho-da-puta não tinha noção. Ele... sei lá, simplesmente fazia as coisas sem se importar com os outros. Foda-se como os outros estavam se sentindo, sabe?

Todo mundo, na verdade, é meio assim. Lá mesmo, por exemplo, pelo menos antes desse memorável evento, os membros da família eram absurdamente falsos uns com os outros. Era sempre assim: conforme as pessoas iam saindo, começavam as fofocas sobre a vida delas. Eles vão falando mal de absolutamente todo mundo. No carro, também, as que saíam, certamente falavam mal de todos os que tinham ficado pra trás.

Mas assim tudo bem. É aceitável esconder esse tipo de comentário dos outros. O tio Victor mesmo, o tal que a minha tia chupa, era todo falso com o namorado da filha dele, chegava a ser cômico. Ele era todo educadinho quando o rapaz aparecia, pedia pra tia Laura oferecer mais refrigerante e tudo mais... uma doçura. Aí, quando o moleque saia, ele parecia ter ciúme da filha mais do que tinha da mulher.

- Aposto que ele come ela - meu irmão disse uma vez, explicando o ciúme.

Cês sabem que ele era meio surtado, então não acho que o meu tio fazia uma coisa dessas com a filha. Só era meio babaca com ela e falso com o namorado da infeliz. Essa tal prima, filha do tio Victor e da Tia Laura, se chamava Mariana. Eu lembro bem da cara dela naquela noite. Só faltou pular de alegria quando o meu irmão repetiu a pergunta:

- Diz, tia Laura? - ele insiste. - Engole ou não engole?

Talvez a garota já tivesse tido que ouvir perguntas indiscretas sobre sua vida pessoal ou sexual ou sei lá. Mas com certeza ela não ousaria colocar os pais na mesma situação. Não sei, eu e meu irmão nunca tivemos problemas com os nossos pais nem nada, então nunca soubemos como essas pessoas se sentem. De qualquer jeito, sempre estranhamos o respeito com que elas tratam os pais depois de eles tratarem os infelizes filhos com o dobro do oposto do respeito com que são tratados.

Não sei se deu pra entender, mas a moral da história é que a minha prima jamais teria coragem de fazer essa pergunta aos pais. Jamais teria coragem de revidar a falta de respeito com a qual ela era tratada. Por isso, provavelmente, ela ficou com um enorme sorriso estampado na cara ao ver o seu pai todo suado com um copo trêmulo de champanhe na mão, enquanto sua mãe respondia:

- Isso... eu me recuso a responder - ela diz, ajeitando o penteado. - Isso é falta de respeito.

E em meio a tudo isso, meu irmão levantou a sobrancelha direita num sinal de confusão. Ele precisou olhar toda a família paralizada ali pra se tocar de que a pergunta que ele fez não era lá a coisa mais normal do mundo. O moleque não entendia. Não era capaz de compreender as reações químicas ocorridas num cérebro humano. Pra ele, era só perguntar. Tudo bem, foda-se: quero saber, pergunto. Não existe nada íntimo. Não existe privacidade. Pelo menos até aquele dia, os pais da Mariana pensavam do mesmo jeito.

4 comentários:

Ana f disse...

Fui eu quem te deixou o scrap. =]
e como já alei no scrap, adorei esse texto!

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

HAUhauhahUAH Adoraria ver uma coisa dessas em minha família .
De todos , só considero meus avós , o resto é tudo farinha do mesmo saco , falsos , criadores de intriga , hipócritas , porra , um bando de fdp!
Será que toda família é assim ?
Cara você tem textos muito interessantes , mais tarde dou outra passada aqui e dou uma olhada melhor.
Parabéns pelo blog!
Abraço

Anônimo disse...

Cara, te achei na comunidade do Chuck Palahniuk, tava vendo os blogs de quem escrevia e olhei vários e achei tudo uma merda. O seu foi o único que me agradou, e bastante! Muito bom seu blog, já li bastante coisa dele por agora, cê escreve bem!
Eu também escrevo, mas nossos estilos são bem diferentes. E tirando os contos que eu pus no meu deviantart, não tenho mais nada na internet. (E os que eu pus lá são os meus contos mais fraquinhos e antigos)
Ainda assim, fica aqui um incentivo procê escrever!
Você tá no meu favorito, então keep up the good work.