Sem mais nem menos, a absoluta inexistência deixou de inexistir e uma enorme explosão criou o tempo e o espaço. Altura, largura, profundidade e tempo simplesmente não existiam e aí, de repente, surgiram. Uma centena de propriedades deram as caras e elementos começaram a aparecer, lançando milhares de combinações aleatórias universo afora. Essa conclusão parece maluca e simples demais para ser verdade, mas a comunidade científica, aparentemente, tem uma série motivos lógicos pra suportar essa teoria bizarra. Então pronto: Big Bang. Sem mais nem menos, simplesmente, tudo começou.
A diferença entre as particulas orgânicas e inorgânicas é que as orgânicas fazem alguma coisa. Na verdade, as inorgânicas também estão sempre fazendo alguma coisa: uma série de condições fisico-químicas fazem com que basicamente todos os elementos estejam sempre sofrendo alguma reação. Ao longo de uma infinidade de reações, porém, formou-se algo com alguma iniciativa própria. Depois de incontáveis bilhões de anos, surgiu algo capaz de se sustentar com um metabolismo próprio. Lá estava a célula, a menor porção de matéria viva. Uma pequena partícula que consiste em uma série de reações químicas que se alimentam de ainda outras reações químicas, gerando uma cadeia que pode durar anos e mais anos. No final das contas, a célula nada mais é do que apenas um pacote de reações comuns, esperando morrer para quando não houver mais o estímulo dessas tais reações para alimentá-la.
Dentre toda essa bagunça química acontecendo pra todos os lados, organismos começam a se formar a partir do princípio dessas reações serem capazes de se susentar a partir outras reações no que consideramos, a primeira vista, um único processo de ação-reação. Eis o processo da vida: estruturas incessantes que começam a produzir a própria energia e se sustentam e se reproduzem num ciclo de milhares de reações. Tudo isso pela mera lógica das coisas.
Durante tanto tempo, é dedutível que tenha ocorrido todo o tipo de reação que se possa imaginar. Atualmente, bilhões de anos depois, é óbvio que só existem em grande número aquelas reações que são capazes de se manter. Dentre elas, então, está a vida, que além de se manter longamente, ainda desenvolveu a capacidade de se alastrar por aí.
Aliás, a vida consiste principalmente nessa ideia de se alastrar por aí. Como todas as coisas vivas morrem, só perduram aquelas que se multiplicam e geram substitutos que as representarão quando morrerem. Como tudo que aconteceu no universo até então, nada foi intencional. A pura lógica e as propriedades da química e da física possibilitaram que seres multiplicadores surgissem e dominassem o nosso planeta, simplesmente porque as coisas são como são desde o chamado Big Bang.
Pois então: lá estavam os primeiros organismos vivos. Coisinhas minúsculas, sobrevivendo pra lá e pra cá e se multiplicando simplesmente porque não existiriam se não se tivessem se multiplicado. No começo, a multiplicação consistia em cópias e mais cópias. Com o tempo, no entanto, essas cópias começaram a dar errado e, como a lógica da natureza explica, as cópias-erradas foram um sucesso.
Com a possibilidade de mutação, surgiu a possibilidade de novos organismos mais complexos. Agora, seres vivos tinham a capacidade de variar e, consequentemente, de melhorar suas formas de sustento e multiplicação. Novamente, o que acontece é casual e meramente lógico: os que pioraram as formas de sustento e multiplicação se estagnaram na evolução e deixaram de existir depois de morrer. Consequentemente, predominaram aqueles que inovavam positivamente conforme surgiam. Eis o conceito da Seleção Natural.
Mais uma vez, o acaso lógico favoreceu os que se situavam mais rapidamente na estrutura de vida que se formava no planeta. Dentre todas as possibilidades, sucederam aqueles seres capazes de manter as caraterísticas positivas que garantiam a sua existência mas que, apesar disso, deixavam uma brecha de possibilidades: a chance de evolução. Agora, os seres vivos não mais dependiam de mutações-surpresa para se formarem. Os seres eficientes o suficiente pra circularem com vida por aí, agora, poderiam combinar com seus similares igualmente bem-sucedidos e formarem novos seres com maiores possibilidades de sobreviver e se multiplicar mundo afora.
Esse sistema de perpetuação de características se baseia na genética e foi assim que nós, os animais, surgimos. Depois de uma longa jornada evolutiva, formaram-se criaturas pensantes capazes de raciocinar e estabelecer toda uma vida no planeta.
Antes disso, as primeiras criaturas eram minúsculas e assexuadas, se reproduzindo através de cópias delas mesmas. Depois, mesmo com a reprodução sexuada, com combinação genética, seres simples e primitivos continuaram reinando. Vegetais e outras criaturas parecidas surgiram no fundo dos oceanos, desenvolvendo uma forma mais complexa de produção de energia, sustento e, finalmente, reprodução.
Tudo o mais que se seguiu foi desenvolvido com base no princípio da reprodução. Criaturas do mar desenvolveram membros locomotores pra ir atrás de alimentos e se sustentarem até a reprodução. As criaturas que se tornaram alimentos, por sua vez, desenvolveram membros pra fugirem de tal destino. Seres se formaram pra fora do mar, dominando a Terra e os céus e todas as regiões que se possa imaginar. Braços, pernas, nadadeiras, olhos, rabos, asas e pétalas: tudo existe simplesmente porque foi capaz de chegar até aqui e segue o instinto natural de continuar o processo de perpetuação.
Num impulso intrínseco e natural, todos os seres vivem de tal forma que seu código genético bem-sucedido combinará com outro código de sucesso fazendo com que, assim, a linhagem continue existindo e se torne cada vez mais eficaz. Enquanto isso, surgem atrasos e confusões, mas esses são logo esquecidos no tempo ao longo da contínua saga evolutiva.
Todo esse ritmo de vida causa uma impressão de que existe uma intenção por trás de tudo, mas não há: tudo isso existe porque surgiu do acaso e se manteve pela lógica do sustento e reprodução. Só existe aquilo que se mantém existente. Só existe aquilo que, por um simples impulso natural, se esforça para se muliplicar e garantir a existência de seu código genético após a morte. Exceções que não compartilham desse instinto podem existir e, de fato, ainda existem… porém, seres assim estão com os dias contados. Por exemplo, uma tartaruga só existe porque, assim que nasceu, correu instintivamente para o mar. É claro que alguma poderia ter decidido ficar parada, mas essas certamente não são as que vimos circulando por aí no oceano.
No geral, então, fomos filtrados de forma a sermos todos reações bio-químicas ambulantes e instintivamente loucas para se espalharem. Como todas as outras formas de vida, tudo o que fazemos é consequência de um ímpeto incontrolável de se manter e garantir uma reprodução de sucesso. Todos os seres evoluíram dos órgãos reprodutores em diante. Nosso intestino serve pra absorver nutrientes que nos manterão vivos para que possamos nos reproduzir. Nossos pulmões servem pra oxigenar o cérebro que coordenará nossas funções reprodutoras e garantirá nossa multiplicação. Todos os órgãos e todos os membros, no final, estão servindo a nossa genitália. Afinal, se não servissem, nossos antecessores simplesmente não teriam nos trazido até esse ponto na história da natureza.
É curioso pensar que, então, todas as criaturas vivas possuem uma mesma única essência por mais diferente que possam ser. No final das contas, todas conseguem entender umas as outras como se já tivéssemos passado pela mesma experiência há bilhões de anos atrás. Note como os animais de estruturas completamente diferentes são capazes de imitar uns aos outros. Bata palma e um golfinho baterá as nadadeiras. Levante um braço e um papagaio levantará a asa. Enquanto isso, um polvo ergue seus tentáculos. É estranho pensar, mas todos esses diferentes membros são a mesma coisa pra todos os animais… em algum momento, nos separamos. No entanto, o mesmo comando em nossos cérebros terá uma equivalência em quase todos os animais diferentes. Lá atrás, no fundo, continuamos sendo a mesma reação em cadeia que se deu após uma imensa explosão.
Outras relações surpreendentes podem ser feitas sobre como somos todos a mesma criatura. Até membros de vegetais possuem equivalentes em espécies animais. Uma flor para a raça humana, por exemplo, é um símbolo de fertilidade. Devido a um longo histórico evolutivo, todos compreendemos a flor como algo bonito e atraente, algo que se prova capaz de promover a reprodução. Ao logo de bilhões de anos, esse apreço por reprodução se formou e, até hoje, continuamos maravilhados com o valor simbólico das flores. A estrutura de uma flor, em muitos casos, lembra o aparato reprodutor feminino ou masculino. É algo de cores fortes e vibrantes, atraente, mágico e bonito… longe de se parecer com uma pessoa, todos sentimos que, lá no fundo, pétalas úmidas e vermelhas remetem a algo profundamente sexual. Assim como frutas suculentas, também, causam uma atração muitas vezes digna de representação de fertilidade. Afinal, não deixam de ser uma parte crucial do processo reprodutivo.
Isso tudo pode parecer muito estranho, mas é um pequeno sinal de que somos o mesmo que uma flor, fruta ou qualquer vegetal. Uma mulher fértil, no fundo, não passa de uma enorme flor com pernas e braços e um tronco e uma cabeça e um rosto e um cérebro: tudo conspirando para que, em algum momento, essa flor cumpra a sua função natural de manter e perpetuar o inacabável processo evolutivo.
Sim, a evolução se baseia numa lógica que a permite ser inacabável. Ao longo da vida humana, não podemos perceber as sutilidades da natureza… mas, ao longo de milhares de anos, espécies evoluem e dão origem a criaturas novas. Algumas substituem seus antecessores. Outras, porém, dão espaço para que seus antecessores evolutivos continuem ocupando seu lugar no planeta. Pode-se observar, por exemplo, que existem plânctons e esponjas do mar até hoje. Existem peixes, lagartos, pássaros, mamíferos… todos em diferentes níveis de complexidade e ainda assim se mantendo e se multiplicando. Essas criaturas, em geral, parecem ser estáveis: morrem e se multiplicam num ritmo tão parecido que parecem não ser capazes de evoluir e se espalhar pelo planeta.
Mas, na verdade, elas são. Ainda assim, o ritmo permite apenas que isso aconteça de forma extremamente lenta e imperceptível. A natureza funciona a partir de seres vivendo em diferentes ciclos e formando todo um ecosistema que tudo se sustenta em harmonia. Espécies extremamente primitivas são as que mais trabalham em sustentar a vida no planeta e são elas as mais pacatas e estáveis na Terra. No final, todos os seres subsequentes se apoiam em seus antepassados vegetais. Além da respiração, grande parte da energia de todos os seres é vinda da alimentação. Um animal carnívoro come um herbívoro que, por sua vez, comeu um vegetal. O vegetal não come como nós, mas é um ser vivo que também respira e se alimenta, produzindo seu próprio combustível a partir da energia do sol.
O sol não é considerado uma forma de vida, mas também não passa de um gigantesco centro de reações inacabáveis. Na verdade, diz-se que o sol vai acabar um dia… mas, até hoje, sua cadeia de reações é tão enorme que ele parece não dar o menor sinal de enfraquecimento. Pelo contrário, essa enorme bola de energia apenas fortalece a vida na terra, sendo a reação primária que abastece todas as reações daqui e impulsiona praticamente todas as formas de vida no nosso planeta. É como se o sol fosse a primeira peça num efeito dominó em câmera-lenta. O sol é uma peça que, até hoje, não terminou de cair e continua impulsionando todas as outras adiante.
A vida nada mais é do que um efeito dominó com uma série de bifurcações. A vida é simplesmente algo acontecendo. Quando deixa de acontecer, torna-se morte. E a morte, afinal, é o equilíbrio a que tudo atingirá em algum momento. A morte representa a possibilidade de finalmente estabilizar o mundo mesmo que por um breve instante, até que venha um novo nascimento de reações.
Por exemplo, uma bola caindo no chão é um fenômeno meramente físico. Ela pode cair e quicar algumas vezes e isso seria, de certa forma, um processo de desequilíbrio. Sua morte ocorreria quando ela parasse de quicar e ficasse estável no chão. Até a ação do vento movimentá-la novamente, ela estaria estabilizada em sua morte. O vento daria início a uma nova reação… a bola rolaria, se moveria de acordo com o chão e poderia cair de uma superfície em outra, novamente dando início ao processo de quicar duas ou três vezes até parar e morrer.
A morte, então, não significa nada. A morte é o fim de uma mísera reação no meio de infinitas outras. Você passa a vida sendo empurrado à multiplicação e aí simplesmente morre de um dia pro outro enquanto a natureza segue com seus ciclos, absolutamente indiferente ao seu destino.
Isso é normal. Toda forma de vida possui, praticamente por definição, um ciclo de vida e morte. Criaturas antigas já estão enraizadas em ciclos estáveis no planeta há bilhões de anos. As mais atuais, entretanto, possuem ciclos cada vez mais instáveis e confusos. O caso da raça humana, possivelmente, é um dos maiores ciclos inacabados acontecendo na Terra atualmente.
Nós, humanos, somos todos animais recém-nascidos. Sendo um dos mais desenvolvidos, somos um dos que estão aqui a menos tempo. Árvores, cavalos e formigas já estão situados há anos. Nós, ainda, estamos completamente perdidos. A raça humana, até hoje, não fechou nenhum ciclo. É claro que morremos individualmente e é claro que seguimos uma mesma estratégia de vida ao longo dos anos… porém, tudo que fazemos fica cada vez mais intenso e catastrófico, nunca se repetindo da mesma forma como foi antes.
O que mudou na vida de um ouriço do mar é irrelevante diante de tudo o que mudou na vida de um ser humano em um intervalo minúsculo de 5 anos. Aliás, em um milhão de anos, uma árvore levava a mesma vida que leva atualmente. Nós, enquanto isso, sequer existíamos. A cada milênio, século, década, ano, mês, semana ou dia… a cada instante, nós vivemos diferente do que vivíamos antes. A espécie humana morre, mas se reproduz ainda mais, seguindo um ciclo que nunca consegue se fechar e se repetir.
Conforme a população aumenta, os instrumentos de sobrevivência da nossa espécie também aumentam e bagunçam ainda mais as coisas. Graças a grande capacidade de comunicação do ser humano, somos capazes de transmitir informações e de evoluirmos tecnologicamente ao longo de muito mais de uma única geração. Muitas pessoas pesquisam e aprendem as propriedades do universo e morrem sem chegar a lugar algum. Essa pesquisa, por sua vez, não morre, e é levada adiante até que alguém, anos depois, chegue a algum lugar. É assim que a tecnologia humana supera a complexidade dos inventos de outros animais que não são capazes da dar continuidade à comunicação por tanto tempo assim. Claro, alguns seres respiram debaixo d'água, outros saltam longas distâncias e outros simplesmente são capazes de comer luz. Dentre tantas habilidades bizarras e inimagináveis, a nossa foi a mera capacidade de registrar informação e comunicá-la a longo prazo.
Abelhas constroem enormes impérios, castores arquitetam represas e aranhas tramam armadilhas das mais complexas pras suas presas distraídas. Nós, surgindo séculos depois, fazemos as mesmas coisas, embora numa velocidade e complexidade cada vez mais intensa. Conseguimos isso porque, assim como todos os outros órgãos de qualquer animal, o cérebro surgiu para garantir sucesso evolutivo. A inteligência e capacidade de raciocínio, por mais que aparente ser desconectada das necessidades instintivas do corpo, não passa de mais uma ferramenta biológica para nos reproduzirmos e mantermos nossa prole. Todos os sentimentos conspiram pra nos presentear quando chegamos perto do nosso objetivo biológico, enquanto as demais sensações nos punem quando fracassamos nesse mesmo aspecto.
As invenções do homem, então, nem sempre se baseiam, diretamente, apenas em sobrevivência e reprodução. Ainda assim, a lógica dos nossos cérebros jamais será capaz de ser absolutamente alheia às forças da natureza. Existem invenções de transporte e comunicação que obviamente auxiliam em ambos os processos, mas também existem tecnologias estranhas que não parecem fazer sentido algum. Evolutivamente, elas são inúteis por não auxiliarem na perpetuação da espécie. Ainda assim, de alguma forma, todas elas estão se aproveitando das boas recompensas instintivas que ganhamos de nosso próprio organismo.
A humanidade se sente atraída por uma série de coisas que remetem a um passado de sucesso evolutivo. Isso acontece porque, aqueles que não prezam por isso, acabam perdendo o interesse reprodutivo e se tornam minorias nas massas da raça humana. Então, qualquer som ou imagem ou sensação, por mais que não cumpra nenhum papel no ciclo da evolução, pode trazer boas sensações aos indivíduos humanos. Uma atividade óbvia, por exemplo, seria a masturbação: um estímulo sexual que gera prazer para que tenhamos a necessidade de sexo mas que, na prática, acontece sem gerar reprodução e ajudar a espécie de forma alguma.
Existem, também, atividades menos óbvias. Manifestações culturais e artísticas são dos exemplos mais complexos de supostas inutilidades biológicas. Mas, se aprofundando no tema, percebe-se logo que toda forma de entretenimento está apoiada em raízes sociais e evolutivas. Tudo o que é bom está provocando nossos instintos fornecedores de prazeres, remetendo a algum sentimento intrínseco e antigo que habita o inconsciente de nossos seres. Alguma região dos nossos cérebros é confundida durante o processo artístico e suas funções recompensadores são provocadas, nos presenteando com boas sensações pelo simples fato de estarmos, vagamente, tocando no assunto de sobreviver bem e ter sucesso evolutivo, mesmo que a longo prazo.
Músicas, filmes e jogos eletrônicos. Nada disso é necessário para a sobrevivência da espécie ou multiplicação da mesma. No entanto, todas essas criações se aproveitam de uma série de sentimentos animalescos que são estimulados dentro de nós. Uma música pode nos fazer pensar numa tempestade, um filme brinca com nossos instintos sociais e um jogo instiga a nossa curiosidade e estimula um instinto aventureiro que se esconde na nossa espécie desde que deixamos de caçar e desbravar territórios desconhecidos.
Por mais que certas coisas pareçam não ter sentido de ser, é possível notar que nada pode escapar da lógica da natureza. Dominamos a superfície terrestre e inventamos uma série de tecnologias inimagináveis aos outros animais. Entretanto, quando um passarinho abre o bico, o relacionamos imediatamente à nossa boca. No fundo, continuamos fazendo parte de uma mesma lógica primitiva, embora sejamos criaturas novas, complexas e confusas, que ainda não aprenderam a se situar nos ritmos ecológicos do planeta Terra.
Mas no fundo, pouco importa. A nossa instabilidade e destruição do planeta é algo que só existe do nosso próprio ponto de vista. Seres humanos podem dizer que destruímos a natureza, mas a verdade é que este é um feito impossível. Destruímos, realmente, a nós mesmos e outras criaturas, já que a natureza vai sempre prevalecer como um todo, de um jeito ou de outro. Talvez, então, sejamos um erro. Não um erro, porque não existe certo aos olhos neutros e indiferentes do nosso universo sem sentido. Então, na verdade, o que somos poderia ser melhor definido como uma simples espécie provisória.
Cresceremos aqui, nos desenvolveremos incessantemente e jamais fecharemos um ciclo ecológico que nos mantém no planeta. Uma espécie meramente temporária. Em algum momento, vamos todos esgotar nosso sustento e simplesmente morrer, acabando com a humanidade e dando espaço para que outros seres mais duradouros e estáveis prevaleçam ou apareçam. Seja como for, por enquanto, a vida humana não passa de um mísero acontecimento efêmero diante da infinidade espacial e temporal do universo.
Somos incapazes de viver em harmonia com nós mesmos e com a natureza. Enquanto a espécie não fechar um ciclo, ela vai continuar sendo uma experiência temporária irrelevante na biosfera terrestre. A incapacidade de se estabelecer vai finalmente anaquilar toda a espécie, a não ser que façamos alguma coisa. Mas, por outro lado, de onde tiraríamos a ideia de fazer alguma coisa?
Assim como a natureza cria sucessos evolutivos, ela cria fracassos. Ao longo de gerações e mais gerações, esse fracasso se agrava e se mostra incapaz de se sustentar. Com o tempo, a espécie fracassada deixa de existir e morre, retornando a ausência de reações e ao equilíbrio. Talvez esse seja o nosso destino e, nesse caso, jamais decidiríamos todos tomar alguma atitude quanto ao nosso fim. O fracasso está geneticamente programado da mesma forma que uma série de outras reações químicas seguem padrões lógicos que as levam a um resultado óbvio, previsível e, às vezes, simplesmente inevitável.
E para nós, as coisas seguem conforme o previsto. Nada diferente acontece. Estamos há anos caminhando rumo ao fracasso e à auto-destruição. O nosso desempenho evolutivo é tão grande e incontrolável que, no final, atingimos um ritmo tão exagerado e ambicioso que no final não se sustentará, mas que infelizmente vai se manter por ignorância. Talvez seja possível deixar de ignorar esse comportamento e, então, se tornar o próximo passo evolutivo na espécie humana. Talvez exista esperança. Talvez, um dia, realmente aprendamos a viver como os outros animais, dentro de um ciclo fechado e harmonioso. Existirá sempre a possibilidade de finalmente se encaixar de forma estável a um ecosistema. Porém, a possibilidade mais lógica e evidente é a de que estamos fadados a uma derrota inevitável.
Pode ser mesmo que a sensatez não seja natural do comportamento humano. A longo prazo, o nosso suposto "sucesso" evolutivo desenfreado pode muito bem se voltar contra nós. E seja o que acontecer, na realidade, seria algo completamente banal pro universo. O que quer que aconteça, seja a compreensão da susentabilidade ou a completa auto-destruição, o futuro da raça-humana já está definido desde antes de seu surgimento. Nada será novidade.
O universo é uma gigantesca reação em cadeia. Reações em cadeia seguem lógicas e lógicas formam fórmulas. Tudo no universo, então, já está seguindo uma fórmula definida desde o começo da existência. Assim como prevemos a velocidade com que uma pedra de tal peso atingirá o solo se atirada com tal força para tal direção, também é possível prever como a espécie humana acabará desde seus primeiros passos. Na verdade, desde os primeiros passos de seu antepassados e certamente desde antes disso e mais antes ainda. Se formos cada cada vez mais atrás, perceberemos que tudo já está com os rumos definidos desde aquela estranhíssima explosão do Big Bang.
De qualquer forma, por mais que tudo já possa estar definido, nós não sabemos calcular todas as incógnitas dessa gigantesca equação e formular uma profecia certeira. Sendo assim, sempre poderemos nos iludir com a sensação superficial de livre-arbítrio e tentar viver em harmonia com nós mesmos e com o resto do planeta. Ou isso, ou morremos todos. De um jeito ou de outro, vivendo ou morrendo, o futuro do desequilíbrio será o equilíbrio. O futuro da instabilidade será estabilidade. Seja se incorporando à biosfera, seja sendo completamente eliminado da mesma, a espécie humana, em seu estado atual, vai morrer.
Sem saber como por fim nos estabeleceremos, então, a raça humana poderia no mínimo se esforçar para garantir um ciclo que possibilite sua existência por compaixão às próximas gerações. Se o universo é absolutamente indiferente a tudo que lhe acontece, somos apenas nós mesmos que deveríamos nos importar com o nosso futuro.
Pelo que parece, porém, o gene egoísta predominante na espécie humana não está se importando com muita coisa que vá além do seu próprio ciclo individual de vida. E dessa forma, aos poucos, se realiza uma assustadora profecia que ainda não foi claramente profetizada. Mas, da inércia e da indiferença, escreveremos um futuro de frieza, sofrimento e, por fim, a praticamente planejada auto-destruição. E enquanto isso, tão indiferente quanto nós mesmos, o mundo continuará como sempre. Logo nos tornaremos apenas mais um mero fracasso evolutivo na história do planeta. E, habitável ou não, a Terra existirá por mais alguns longos anos.
Nada disso importa na história da nossa galáxia e muito menos de todo o resto do universo. Na realidade, toda essa história pode muito bem não fazer o menor sentido. Afinal, projeções só são possíveis porque partem do princípio de que certas coisas não vão mudar. Leis físicas e químicas são chamadas "leis" apenas porque nós observamos que, até então, elas não variam. Ou, se variam, o fazem de acordo com alguma outra lei que inventamos ao notarmos tal variação.
Por si só, as leis não existem. O universo não segue regras e, devido a sua completa falta de explicação, ele não precisa nem seguir a sua própria lógica. Então, na teoria, absolutamente qualquer coisa, dentre uma aleatoriedade infinita de coisas, pode realmente acontecer com tudo e todos a qualquer instante. Sem mais nem menos, toda a existência pode apenas acabar tão inexplicavelmente quanto começou.
Fim.
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