sábado, 16 de fevereiro de 2013

Zutu chega à cidade de Infra-Rios

(Início de "Zutu, Episódio II: Zutu e o Monstro da Bolha")

Chove um pouco naquela manhã e toda a família se reúne em volta da encubadora. Dentro dela, um grande ovo com uma luz morna e rosada em seu centro, brilhando com ternura. Ansiosos, ao redor, os parentes aguardam.

- Vai nascer a qualquer momento…

São todos azulados, um tanto pálidos, vestindo roupas brancas que cobrem o corpo inteiro. Embora a cabeça não seja revestida, usam todos um capacete transparente, como se fossem astronautas em outro planeta.

- Veja, veja… está começando a tremer…

Silenciosa, a mãe do bebê abraça seu marido e o vidro de seus capacetes se tocam. Ela chora, mas não escorrem lágrimas. Suas pupilas apenas dilatam, cada vez mais, até seus olhos ficarem quase completamente pretos de tanta emoção. Enquanto isso, também emocionado, seu marido a abraça, sorrindo por baixo de seus bigodes grossos como pequenos tentáculos.

A casca do ovo se rompe e uma gosma rosada começa a escorrer pra fora. A encubadora começa a apitar e um homem se aproxima para apertar alguns botões, regulando a temperatura ali dentro. Mãozinhas pequenas e azuladas começam a escapar pra fora do ovo, brilhando, e a família inteira observa com olhos grandes e negros.

- É uma menina…

A criaturinha bota a cabeça pra fora, azul, com pequenos olhinhos pretos e confusos. Eles encaram a família do outro lado do vidro da encubadora, e o bebê logo abre sua boquinha coberta de finos tentáculos e começa a chorar. O homem aperta mais alguns botões na encubadora e os familiares se abraçam, emocionados.




***




No galho de uma árvore, um passarinho mordisca frutinhas amarelas. Ainda está tudo molhado no bosque, mas não parece estar mais chovendo por ali. Pingam apenas mais algumas gotas esparsas, preguiçosas, que escorrem da folha das árvores finas e compridas dali. Zutu se aproxima e o passarinho voa.

Ele pega uma daquelas frutinhas amarelas e aproxima de seu multibat em tamanho mínimo. O aparelho ativa um pequeno holograma e apresenta uma lista de informações nutritivas. No final, concluindo com uma luz verde, ele confirma que aquela fruta era comestível. Seguro, então, Zutu coloca a coisinha na boca, que tem um gosto forte e azedo… mas logo se dissolve, deixando um sabor doce e agradável.

Zutu segue a caminhar pelo bosque, pisando na lama e em folhas caídas, ouvindo apenas os próprios passos e o cantar dos passarinhos que saem de suas casas e avisam uns aos outros que a chuva havia acabado. Lá em cima, no céu, nuvens brancas teimam a se retirar, mas algumas brechas já permitem que a luz do sol comece a voltar a iluminar e aquecer o lugar.

De repente, um homem de branco surge por ali, apressado, carregando algumas placas metálicas nos braços. Zutu para de andar por um instante e apenas observa.

- Não acredito, não acredito…

O homem fala sozinho, virando a cabeça dentro de seu capacete e olhando pra todos os lados. Subitamente, numa pedra, ele tropeça. Quatro placas caem na lama.

- Não, não, não…

Ele começa a catar aquelas coisas. Confuso, Zutu se aproxima pra ajudar:

- Você está bem?

- Aaaaahh!!!

O homem grita, assustado, e Zutu acaba se assustando também. Foi tudo muito rápido, mas pôde notar que aquela criatura não era humana, e tinha um rosto azulado, sem nariz, com dois olhos grandes e assustados e alguns tentáculos cobrindo a boca como se fosse um bigode. O homem logo saiu correndo, largando duas de suas placas ali mesmo no chão. Zutu, sem entender o que estava havendo, prefere não correr atrás para não assustar ainda mais aquele homem. Apenas pega aquelas duas placas na lama e segue caminhando na direção pra onde ele correu.

Estranho. Em sua caminhada, era a terceira ou quarta vez que Zutu via aquela grossa camada transparente em seu caminho. Enquanto vagava pelo bosque, se deparou com várias muralhas como aquela. São grossas, duras, transparentes, e vão metros e mais metros acima do chão. Lá em cima, aquelas paredes se curvam até formar um teto, como se fossem a película de uma enorme bolha. Ainda assim, Zutu não teve dificuldades pra penetrar aquelas diversas camadas. Pareciam estar em ruínas, repletas de casulos, raízes, cogumelos e outras formas orgânicas… além disso, estavam cheias de buracos quebrados e rachaduras, e por isso Zutu conseguia avançar por ali tão facilmente. Não sabia bem pra onde estava indo… mas sentia estar se aproximando cada vez mais do centro daquela estranha estrutura.

Finalmente, pela primeira vez, uma porta separava uma camada da outra. Dessa vez, tudo parecia bem preservado. Era uma porta grossa e de ferro, grande o suficiente para uma ou duas pessoas, mas pequena demais pra qualquer outra criatura significativamente maior. Através da parede transparente como sempre, Zutu pode ver o homem de branco de novo, correndo lá dentro, assustado.

- Ei! - Zutu grita. - Suas placas!

O homem não parece ouvir. Zutu apenas encara aquelas coisas lisas e prateadas em suas mãos, sem entender o que são.

Ploc, ploc, ploc, ploc…

Passos desesperados mergulham na lama. Está chovendo por ali e o homem azul começa a gritar pra todos na vila:

- Ele está vindo!!! Ele está chegando!!!

É uma cidadezinha pequena, repleta de pequenas casas e outras estruturas de madeira. Ali dentro, não há prédios ou ruas ou nenhuma coisa do tipo. Há apenas um aglomerado de casas e estruturas simples, em cima de um chão coberto de grama e terra… no caso, como estava chovendo, lama. Logo todos começam a correr.

Metros atrás, Zutu se aproxima com calma. Antes que possa bater naquela porta, ela se abre automaticamente. Uma das placas que ele segura brilha por um instante, num tom esverdeado. Blim! Um pequeno apito e Zutu sente-se autorizado a entrar, enfim, na última camada daquela bolha. Ou ao menos a única que permanecia intacta.

A primeira coisa que Zutu nota é a mudança na temperatura ali dentro. É consideravelmente mais frio, e por algum motivo está chovendo ali enquanto do outro lado da porta simplesmente não está. Zutu acha isso confuso, e a chuva e o frio começam a incomodá-lo. Ele pensa em colocar um casaco, mas logo observa as diversas casas e estruturas de madeira ao seu redor e prefere se abrigar debaixo de alguma delas. 

Mas não. Talvez não seja possível. A vila está completamente vazia e todas as casas e construções parecem devidamente trancadas, caladas, talvez até abandonadas. Como assim…? 

Zutu fica confuso, ali na chuva, sozinho, sem saber o que fazer com aquelas placas na mão. De repente, em algum lugar, alguém abre uma pequena janela. Escuta-se um grito:

- Seu idiota!!!

Zutu vira, vendo uma criatura gritar de dentro de seu capacete.

- Ele é só um humano!!!

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